14/03/2017
Quatro pessoas foram presas em operação realizada nesta terça (14).
Cinco cidades gaúchas foram alvo; uma pessoa está foragida.
"Eu te liguei porque 'temo' um 'pepino' no creme aqui. Tá 5,82 o PH e a
acidez 11", diz um investigado. "Faz assim, ó: vai botando soda e mexe,
deixa o PH em 6,30 e alguma coisinha e aí carrega", responde o outro.
Este é um dos trechos das gravações obtidas pelo Ministério Público
durante investigação de três empresas de laticínios na 12ª fase da
Operação Leite Compensado, que apura adulteração no leite, deflagrada nesta terça-feira (14) no Rio Grande do Sul.
Quatro pessoas foram presas durante o cumprimento de cinco mandados de
prisão e quatro de busca e apreensão em Nova Araçá, na Serra, Casca e Marau, no Norte do estado, e em Estrela e Travesseiro, no Vale do Taquari. Uma pessoa está foragida.
De acordo com as investigações, os proprietários das empresas ordenavam
a adição de produtos para disfarçar que o material era impróprio para o
consumo.
Os laudos elaborados pelas próprias empresas eram adulterados para que a
fiscalização e os compradores não identificassem os problemas, aponta o
MP.
"São três laticínios investigados, abrimos ainvestigação em outubro [de
2016]. Estavam recuperando o creme de leite já envelhecido, estragado,
botando neutralizantes, enfim, recuperando produtos já impróprios para
consumo", destaca o promotor Mauro Rockenbach.
A previsão é que mais de 40 pessoas deem depoimento até o final da
semana que vem, quando o MP deve apresentar a denúncia à Justiça da
Comarca de Arroio do Meio.
Empresas são suspeitas de adulteração de material impróprio para consumo humano (Foto: Francieli Alonso/RBS TV)
Sobre as empresasNa indústria Laticínios Modena (nome fantasia Bonilé), de Nova Araçá, o problema estava na produção de creme de leite. O produto, impróprio para consumo, recebia adição de água e voltava a ser comercializado. Dois funcionários da empresa foram presos.
Em Travesseiro,
as ações foram feitas na empresa de laticínios Rancho Belo, onde foram
apreendidos documentos e amostras dos produtos. Segundo o MP, leite in
natura e creme de leite industrializado, já impróprios para consumo,
eram levados para o local. Lá, eram adicionados produtos para controlar a
acidez e eliminar os micro-organismos. O material era embalado e
revendido para supermercados.
O dono da empresa em Travesseiro foi preso, assim como um transportador, já na cidade de Estrela.
Além disso, a indústria teve as atividades suspensas pela Fepam em
virtude de irregularidades na licença de operação e inadequação de
descarte de resíduos, entre outros.
Os produtos da empresa iam para a rede de supermercados Dia%. O chefe
do serviço de inspeção do Mapa, Leonardo Isolan, informou que será feita
a rastreabilidade para indicar se há ou não problemas com o leite da
marca e, assim que forem obtidos os resultados, as ações cabíveis serão
adotadas.
"Creme de leite e creme de soro são matérias primas para a elaboração
dos produtos finais, o que significa que as ações estão cada vez mais
preventivas. Já que o índice de conformidade no produto final é de 99%",
apontou.
O funcionário da empresa de Casca, a Princesul, não se apresentou ao Ministério Público e é considerado foragido.
Nesta empresa, foram localizadas 5 toneladas de queijo que haviam sido
devolvidos por um laticínio de Maceió, Alagoas. "Os queijos estavam
vencidos, impróprios, totalmente sem padrão, e a devolução de produto
era algo comum, já que a própria rede Dia% devolveu muitas cargas em
virtude de problemas com embalagem ou azedos, mesmo dentro da validade",
disse.
O mandado de busca e apreensão cumprido na M&M Assessoria,
contratada pela Laticínios Modena, ocorre porque, de acordo com
relatório do Mapa, em grande parte dos postos de resfriamento e
laticínios onde a empresa atuou, foram constatadas adulterações no leite
cru in natura e em derivados.
A Laticínios Modena disse ao G1 que reuniria
informações antes de fazer um pronunciamento sobre o caso. À reportagem
da RBS TV, a empresa ainda salientou que não tem conhecimento do que se
trata a operação, e nem o motivo de ser investigada.
Não foi possível encontrar representantes da Indústria de Laticínios
Rancho Belo. Ninguém foi encontrado na Laticínios C&P para comentar
sobre o assunto. O portal ainda não conseguiu contato telefônico com
representantes da M&M Assessoria.
Segundo a investigação, produtos eram adicionados ao leite já imprópriopara consumo (Foto: Marjuliê Martini/Divulgação/MP)
Como funcionava a fraudeNa prática, os três laticínios recebem e repassam entre si leite cru, creme de leite e soro de creme fora dos padrões previstos pela legislação brasileira, segundo o MP. Muitas das cargas chegam a ser refugadas por outras empresas e acabam sendo comercializadas para estas indústrias.
Alguns elementos da investigação apontam que carregamentos de leite que
só poderiam ter como destino a alimentação de animais, foram usados
para a industrialização de produtos de consumo humano.
Em mais de dez Certificados Técnicos de Análise emitidos pelo
Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa) realizados em
leite cru, leite UHT e nata, foram detectados índices fora dos padrões.
Conforme as investigações, os sócios-proprietários das empresas
ordenavam a adição desses produtos para corrigir a acidez e eliminar
micro-organismos, com objetivo de "rejuvenescer" o produto já vencido,
impróprio para o consumo.
No caso da água, ela era adicionada para que o creme de leite duro, já
amanteigado, fosse novamente amolecido e misturado a outras cargas em
condições melhores. Os laudos realizados pelas próprias empresas eram
mascarados, para que tanto a fiscalização quanto os compradores não
visualizassem os problemas, diz o MP.
Fonte: G1 RS
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